Noite de verão ameno e chuva fina. Garrafa de vinho como sempre na despensa, aguardando a companhia de um bom DVD. Uma busca na locadora me apresenta o filme até então desconhecido: Paris. Nada mal rever a cidade que tanto me encantou há um mês em minha viagem à Europa. Foi essa a motivação de levar para casa ontem o filme de Cedric Klapisch, estrelado por Juliette Binoche e outros excelentes atores franceses.
O filme em nada nos decepcionou em relação às expectativas de trazer lembranças tão vivas à memória. O passeio pela cidade de Paris é completo, fazendo quem conhece a cidade reviver sua magia e quem não a conhece, querer pegar o primeiro avião para lá, como bem diz a crítica na capa do DVD. A boa surpresa foi a história em si e como ela se apresenta. São diversas amostras das vidas de desconhecidos que de alguma forma se entrelaçam em torno de uma história central: um rapaz jovem que recebe de seu médico a notícia de que uma doença no coração irá roubar-lhe a vida em pouco tempo.
Embora possa parecer um tema piegas, não há pieguice no filme. Olha que eu sou uma manteiga derretida, daquelas que se controlam para não chorar copiosamente numa cena banal de reconciliação entre namorados apaixonados. Entretanto, em nenhum momento sequer um nó na garganta me surgiu. O filme é leve, agradável, flluido. E por isso mesmo faz pensar. Se fossem cenas sentimentaloides, a emoção exacerbada poderia encobrir um enredo aparentemente pouco original. Mas não é o caso. São retratos da vida de pessoas como eu e você. E, mais que isso, a estampa de quão frágil a vida é. A imprevisibilidade é destacada logo no início, com o resultado da ultrassonografia revelando o fim de quem se espera viver por muito tempo ainda. E não pára por aí. Uma situação inesperada envolvendo outra personagem ocorre, expondo mais uma vez o débil fio que nos anima.
É incrível que possamos aceitar, ainda com certa resistência, a idéia da morte consequente do tempo que deteriora e faz sucumbir. Sabemos que tudo que é matéria se desgasta e podemos prever o tempo da deterioração material. A madeira apodrece, o ferro enferruja, e os órgãos do corpo humano falem. O que nos recusamos a aceitar, entretanto, é que qualquer matéria é frágil o suficiente para ruir antes do tempo esperado. Um objeto de madeira pode ser infestado por cupim, estruturas de ferro podem ser prejudicadas pela maresia, e o coração pode ser acometido por uma doença irremediável. A fragilidade pode também se expor diante de uma intenção: o tronco de madeira ceifado, o ferro incendiado, o corpo esfaqueado. Por mais que se busquem os culpados pela devastação da floresta, pelo incêndio no prédio ou pelo assassinato da pessoa, a matéria está desfeita. E nada traz a vida de volta.
Muitas vezes creditamos à injustiça divina ou à irresponsabilidade humana a causa da perda da vida, pois precisamos de paliativos para acalentar nossos corações sufocados de dor. Mas, na verdade, buscamos razão para o irracional.
No filme de ontem, o jovem à espera da morte torna-se reflexivo sobre a sua vida e a dos outros, aproxima-se da irmã de quem se distanciara, conta para a namorada de infância o quanto ela foi importante e reúne amigos numa comemoração sem motivo especial. Enfim, diante da constatação premente do que nos recusamos a aceitar, ele parece adquirir consciência dos valores que realmente importam: os laços afetivos e a verdade consigo mesmo. Ele se recusa a iludir a si próprio, e admite por completo a realidade que todos nós queremos ocultar de nós mesmos.
Afinal, por mais difícil que seja, viver verdadeiramente é romper qualquer tipo de ilusão e encarar o maior medo que se tem na vida: o medo da morte.
Por isso que é sempre bom a gente viver as felicidades da vida sem medo, preconceito, receio ou qualquer tipo de trava.
ResponderExcluirA vida fica muito mais leve assim.
Tem um filme (Biutiful) que fala um pouco dessa temática. Conhece? Se não, recomendo!
Bjos
Assisti a esse filme semana passada, e gostei muito !!
ResponderExcluirApesar dos personagens interagirem como você bem falou, me pareceu nesse filme é como se Paris estivesse assistindo os seus moradores e transeuntes pelas ruas de Paris, pelos cafés de Paris, pelas alamedas, praças e vielas de Paris.
Como se fossem personagens do cotidiano, assim como nós, sendo observado pela cidade luz ! Amo a atriz que fez a vizinha de janela do Jovem condenado a morte !!Ela fez Toda forma de Amor, filme que deve dar o Oscar de ator coadjuvante a Christoph Plummer !!Ela esta irreconhecivelmente loira !!
E a participação de Juliette Binoche dispensa comentários...
Mas voltando ao filme, acho que não devemos espera descobrir que estamos em um estágio terminal para ficarmos ao lado de quem amamos, e nem ver as sutilezas da vida depois de um baque forte. Vamos resgatar isso, estar ao lado de quem é importante, almoçarmos e estar próximo aos nossos amigos, pais, irmãos, filhos, sobrinhos, primos, tio e avós. Estamos perdendo a nossa ascendência e cuidando apenas dos nosso filhos, como se estivéssemos desesperado de dar a eles o que não recebemos de nossos pais. E isso afagasse nossos sentimentos e expulsassem nossos fantasmas.
Somos quem somos por causa de nossa história e nosso passado, e assim será o de nossos descendentes. Devemos fazer a diferença hoje e não deixar para quando o jogo terminar.
O personagem do filme ainda teve esse tempo precioso, e me doía ver que ele queria curtir e dançar a festa dele como nos velhos tempos, mas o coração falhava.
E se o inevitável chega e não temos esse tempo !
Filme belo, sob o ponto de vista da cidade, idem sobre a história e didático.
Gê, essa é uma tremenda deixa pra gente se encontrar mais, né? rsrsrs
ResponderExcluirConcordo com você!
bjs